terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Resposta de Kateb Yacine ao jornal parisiense Libération, em 20 de julho de 1988

"Descobri rápido, disse Sócrates, que não é pela sabedoria que os poetas criam suas obras, mas por um certo poder natural e pela inspiração, como os divinos e profetas que falam tantas coisas belas, mas não compreendem nada do que dizem." "A poesia, disse Shelley, não é como o raciocínio, faculdade exercida de bom grado.... O maior poeta não pode exprimi-lo." Blake confessa que escreveu seu poema Milton sem premeditar. Keats não estava consciente do que escrevia "por acaso ou por magia", isso lhe parecia a "produção de um outro". Goethe: "os cantos me fizeram, não fui eu quem os fiz." Mais lapidário, Rimbaud: "Eu é um outro." Wordsworth estava em transe quando concebeu sua conhecida ode: "As coisas que caem da gente, que se desvanecem..."
Conheci esse estado colaborador num inverno em Paris, terminando ao mesmo tempo, quase simultaneamente, Nedjma e Le cadavre encerclé. Em menos de dois meses, tudo acabou. Era maré cheia, eu era como um rio na tempestade. Escrevia sentado, em pé, comendo, e mesmo no sono: vinham-me de repente estrofes e frases que me acordavam em sobressalto. Tudo isso mostra a parte inconsciente no trabalho do poeta ou do escritor. O que passa longe da política.   

(tradução livre)
Kateb Yacine, Le Poète comme un boxeur: 
entretiens 1958-1989, Éditions du Seuil, 1994.