quinta-feira, 28 de março de 2013

O delírio verbal de Kateb Yacine


"Perante a estagnação da literatura árabe, a literatura argelina continua a produzir obras diversificadas. Não se pode portanto falar de uma escola argelina, mas de um grupo de indivíduos unidos por uma mesma componente: a Argélia. (...) Em face desta geração que nasceu, literariamente  em 1945, existe a geração de 1956, da qual Kateb Yacine aparece como único e o mais prodigioso representante. Numa prosa poetisada até ao delírio verbal, a obra de Kateb Yacine é um vaivém entre o mito e o real.* (...)"

Rachid Boudjedra 
 A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
 Livros do Brasil (1972) pp. 152-153
[*Maurice Nadeau em France-Observateur, 1956]

Poesia de expressão árabe

"Pelos anos de 1930, o movimento reformista dos ulemás vai auxiliar a abertura de uma poesia voltada essencialmente em defesa do islamismo e da integridade da personalidade argelina  Um dos mais ilustres arautos deste movimento foi o xeque Abdel Hamid ben Badis. (...) 
[A literatura argelina] permanece também ligada a uma forma demasiado clássica que a sufoca e a impede de se universalizar. Contudo, após alguns anos, todo um movimento de jovens poetas (...) tenta fazer sair a poesia argelina de expressão árabe da sua golilha esterilizante. (...)"

Rachid Boudjedra 
 A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
 Livros do Brasil (1972) p. 151

Em nome do alimento e do sal

"Na Argélia, não se ousa atraiçoar aquele com quem se compartilhou uma refeição, senão, usurpar-se-ia um contrato muito importante que é resumido na seguinte fórmula: Em nome do alimento e do sal!, pronunciada muito frequentemente durante uma refeição. (...)"

Rachid Boudjedra 
 A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
 Livros do Brasil (1972) p. 78

Seroual, gandoura e kab'kab'

"As calças femininas são chamadas seroual. Com as calças, as mulheres usam boleros justos à cintura, com mangas muito largas e recortadas nos punhos. Entre os ricos, os boleros são muitas vezes bordados, de cetim ou seda de cor clara. Quando não usa calças, a mulher veste uma gandoura, espécie de vestido muito comprido e muito amplo cujas mangas são por vezes em tule, necessariamente chegada à cintura por um cinto de prata ou de coiro trabalhado. Nos pés, a argelina calça em casa os kab'kab', espécie de tamancos de madeira. O pé é sustentado por uma correia de coiro através da qual passa. (...)"

Rachid Boudjedra 
 A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
 Livros do Brasil (1972) p. 72

Egoísmo masculino

Ó Profeta, diz às tuas mulheres, às tuas filhas e às mulheres dos 
crentes que se guardem nos seus véus. 
Será o meio mais seguro de serem respeitadas. (Corão, 33-59)


"A mulher argelina participa muito pouco no desenvolvimento económico do país e continua dependente do homem. Por este motivo, mantém-se um ser menor cuja abertura é essencialmente impedida pelo egoísmo masculino. (...)"

Rachid Boudjedra 
 A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
 Livros do Brasil (1972) p. 65

Solidariedade de clã

"Na Argélia  o que chama mais a atenção, por ocasião da morte de uma pessoa, é o interesse que a comunidade inteira lhe devota. A este nível, a tragédia da morte é sentida, muito mais do que noutro ponto, como um atentado aos sentimentos de todo o meio social, devido a um certo poder das relações interfamiliares e intergrupais. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma forma de solidariedade de clã (...). 
Um provérbio do Sul argelino diz: Cada lágrima que cai por um morto, é para ele uma faísca no Inferno. Na realidade, a religião muçulmana proíbe que se chorem os mortos em demasia. (...)  Muitas vezes, em certas regiões da Argélia rural, há o costume de deixar a porta da casa aberta, para permitir a todos que o desejem - mesmo desconhecidos - compartilhar a dor da família e exprimir as suas condolências. (...)"

Rachid Boudjedra 
A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
 Livros do Brasil (1972) p. 54

Fada benfazeja

"Para as crianças argelinas, os irmãos e as irmãs não nascem das couves. É uma fada benfazeja que as coloca na cama da mãe. Isto, diz a lenda. Na realidade, o nascimento de uma criança é considerado como um grande acontecimento nas famílias argelinas. Com esta finalidade, um certo número de ritos e de cerimónias são organizados em honra de recém-nascido e de sua mãe. (...)"

Rachid Boudjedra
A vida contemporânea na Argélia na época contemporânea 
Livros do Brasil (1972) p. 17

Acréscimo de nudez

"O eterno jogo de Nedjma é reduzir o vestido ao mínimo em poses acrobáticas de avestruz estimulada pela solidão; sobre uma tal pelagem, o vestido é um acréscimo de nudez, a feminilidade de Nedjma está algures (...)"

Kateb Yacine 
 Nedjma Tricontinental Editora (1987) p.70

terça-feira, 26 de março de 2013

Ao andar emproa-se



Kateb Yacine 
 Nedjma Tricontinental Editora (1987)

segunda-feira, 25 de março de 2013

A Arte do "Zajal" | Estudo de Poética Árabe | Michel Sleiman


Michel Sleiman
Ateliê Editorial (2008)

Miasmas de hortelã e de lírio

"Os miasmas dos dias cada vez mais quentes de Junho persistem, apesar das lavagens a balde; mas são miasmas de hortelã e de lírio (...)"

Kateb Yacine 
Nedjma  Tricontinental Editora (1987) p.157

Assim vai um dos maiores livros da literatura árabe (e mundial...) nas nossas bibliotecas:



Cheio de luz no rosto

"As minhas lágrimas, tão grandes, encharcaram-me
os pés mais o tapete verde do mihrab,
sob o olhar benigno de Maulana
Kássimo Taybob, cheio de luz no rosto
e aura azul-celeste a envolver-lhe o corpo. (...)"

António Barahona
Raspar o Fundo da Gaveta e Enfunar uma Gávea 
Averno (2011), p.27

sábado, 23 de março de 2013

As mulheres na poesia árabe contemporânea


"This anthology was prepared to eradicate invisibility: to provide an introduction to Arab women poets, to make visible the works of a great number of Arab women poets who are virtually unknown to the West, to make visible how many Arab American women poets are marginalized within the American literary and ethnic scenes, and to demonstrate the wide diversity of Arab women's poetry..."

Nathalie Handal
(do prefácio)

sexta-feira, 8 de março de 2013

Algumas palavras berberes

Tafuyt - Sol
Oungaal - Preto
Issalman - Peixes
Alkhekh - Areia
Serwal - Calças
Adad - Dedo
Samhi - Perdão
Tadart - Casa
Drra - Milho
Afuus - Mão
Amnassf - Metade

quarta-feira, 6 de março de 2013

Metempsicose?

"Nedjma: não é ela a reencarnação de Eurídice trazida dos infernos por Orpheu, seu amante? Não ela a sua [de Kateb Yacine] metempsicose?"

Benamar Médiène
trad. por aqf

segunda-feira, 4 de março de 2013

A sombria vivacidade de um muro de terra seca

"Mesmo aos trinta anos, nómada como era, só acreditava na sua sombra, e parecia-lhe que o excedente dos anos ia um dia ser reabsorvido no vazio, conter o seu passado transbordante, como se tivesse consciência de andar em círculo, sem abandonar o ponto de partida, que situava vagamente entre o salto do berço e as vagabundagens em torno do Rochedo*, de maneira que o círculo não passava de um passeio a contragosto que por pouco o não perdera, de onde regressava às apalpadelas, não só ele, o adolescente voltando ao bom caminho, não, o seu fantasma votado a essa triste caminhada de cego chocando com o fabuloso passado, o amanhecer, a primeira infância em direcção à qual permanecia prostrado, repetindo palavras e os gestos da raça humana com uma fluidez que o deixava interiormente intacto, como um caroço prestes a germinar sob outros céus, bloco errático dotado de imperturbáveis recordações, tendo sempre sentido materialmente a sua existência em fuga, à maneira de uma erva ou de uma água, e, por volta dos cinco ou seis anos, lembrava-se de ter adoptado a sombria vivacidade de um muro de terra seca que abraçava, ao qual foram dirigidos os seus monólogos de órfão. (...)" 

Kateb Yacine 
Nedjma 
Tricontinental Editora (1987)

*Referência à sua terra natal, Constantina na Argélia.

domingo, 3 de março de 2013

Uma infância de lagarto à beira de um rio desmaiado

"Que belo dia, que magnífico pedaço de céu!
Lembrei-me da minha audaciosa infância; é verdade, eu era livre, era feliz no leito de Rhummel; uma infância de lagarto à beira de um rio desmaiado. Nas horas mais quentes, adormecia debaixo dos cedros, e o sono expulsava a melancolia; acordava inchado de calor. Parecia-se com esta alegria, sob a figueira, o ver Nedjma à saída do banho, distante, mas sem desaparecer, qual astro impossível de pilhar na sua fulgurante luz. (...)"

Kateb Yacine 
Nedjma 
Tricontinental Editora (1987)